terça-feira, 29 de abril de 2008

Impávido como um bom selvagem



Gosto muito do trabalho de Ndrua. Nos seus grafites há um personagem recorrente: um índio-mestiço-caboclo-brasileiro. Quase sempre ele aparece empunhando seu remo e a canoa vai desbravando e revelando as diversas paisagens da cidade.


Fotografei dois desses grafites, duas composições em pontos diferentes da cidade, expressando seus contrastes, polarizando modos de ser e de viver aqui. Um deles decorava uma loja nos jardins, um dos paraísos do consumo sofisticado, luxo do luxo desta cidade. O outro está nos portões de uma cooperativa de catadores, de gente que vive das sobras, dos descartes, do lixo. De permeio, o índio-mestiço-caboclo-brasileiro, figura portadora das muitas fantasias de uma vida em equilíbrio com seu meio, com a natureza. Pura ironia das histórias.








quinta-feira, 17 de abril de 2008

cidades


A cidade é moderna
Dizia o cego a seu filho
Os olhos cheios de terra
O bonde fora dos trilhos
A aventura começa no coração dos navios
Pensava o filho calado
Pensava o filho ouvindo
Que a cidade é moderna
Pensava o filho sorrindo
E era surdo e era mudo
Mas que falava e ouvia

terça-feira, 15 de abril de 2008

para um poema de lindolf bell


Venho dessas perguntas terra a terra.
Da contradição do pavão sem penas.
Aquilo que a língua não disse.
Do que subjaz à saliva.
O que se faz ardume na vontade de dizer, desdizer.
E de ter perdido o medo da pronúncia correta
e a vergonha da palavra solidariedade.

terça-feira, 8 de abril de 2008

a descoberta do mundo

Por que é que um cão é tão livre?
Porque ele é o mistério vivo que não se indaga.

Não ter nascido bicho parece ser uma das minhas
secretas nostalgias.

clarice lispector

segunda-feira, 7 de abril de 2008

para um poema de fabrício carpinejar



Estou mais perto de ser real.
Não dependo das rédeas
seguro-me nas crinas.






domingo, 6 de abril de 2008

quarta-feira, 2 de abril de 2008

memória de cartão postal - bondes









Outros murais com paisagens antigas de São Paulo. Eles estão em Pinheiros. Os dois trazem os bondes como elementos que se destacam na paisagem. Os bondes também estão presentes em outros murais. Por que será? É claro que a paisagem pintada no mural é uma escolha do muralista, reflete suas preferências, objetivos, subjetividade. E talvez, os bondes estejam lá simplesmente porque o autor gosta de bondes. Ou porque o bonde estava na foto escolhida. Ou pela importância que os bondes tiveram na cidade. Não sei.

Independente das intenções dos muralistas, o cartão postal ativou minha memória. Lembrei-me das idas e vindas na linha que ia da Praça João Mendes ao Largo São Sebastião: Bonde 101 – Santo Amaro. Eu ia para a escola de bonde, nessa que foi a última linha em circulação em São Paulo, desativada em 1968.

Nesses dias em que os problemas causados pelos congestionamentos, pela precária mobilidade urbana, são constantemente pautados pela mídia, quando a palavra “trânsito” virou o seu oposto, virou sinônimo de congestionamento, ao ver os bondes nos murais, fiquei me perguntando: - Por que não? Porque os bondes foram retirados de circulação? Porque não são lembrados como alternativa de transporte coletivo? Eles que são silenciosos, utilizam energia mais limpa, e certamente, sua implantação é mais econômica do que a do metro. Mistérios... Não há aqui saudosismos, não é isso que me move, mas o desejo e o direito cidadão de viver numa cidade mais habitável. Por que o bonde - ou veículo leve sobre trilhos, como é atualmente chamado - utilizado em muitas cidades européias e asiáticas, não serve para São Paulo?

É essencial que os grupos políticos que já se anunciam como candidatos à prefeitura de São Paulo apresentem, em seus programas de governo, as diretrizes para um plano diretor de trânsito e transportes para a cidade, que contemple um conjunto de alternativas e soluções possíveis, estruturais ou não, para serem discutidas pelo conjunto da população.

Quero voltar a utilizar o bonde como opção de transporte coletivo e não como folclórica alternativa de laser.