segunda-feira, 10 de março de 2008

rupestres



Que instinto primordial detonou essa busca para o registro, para a representação, para a preservação da memória, para a construção do sagrado, para as sensibilidades estéticas? Perguntas, perguntas, perguntas... Talvez tudo se resuma ao acaso e ao assombro de perceber que as mãos manchadas de sangue deixaram uma impressão na parede. Talvez.

A arte rupestre, da pré-história ou das sociedades pré-colonização do novo e novíssimo mundo, me toca encantamentos, transcendências... principalmente essas imagens sem outro símbolo que a impressão das mãos, por primordial que ela me parece ser.


Encontrei as impressões de mãos também nesse grafite, na Praça Roosevelt, caverna urbana cheia de precários acampamentos. Não sei quem grafitou, nem qual era sua intenção. Pra mim provocou essa sensação de eterno retorno, por mais pós-tudo que imaginamos ser.

Nesses tempos de imprecisão dos conceitos, só a poesia nos salva.

Por viver muitos anos dentro do mato
moda ave
O menino pegou um olhar de pássaro —
Contraiu visão fontana.
Por forma que ele enxergava as coisas
por igual
como os pássaros enxergam.
As coisas todas inominadas.
Água não era ainda a palavra água.
Pedra não era ainda a palavra pedra.
E tal.
As palavras eram livres de gramáticas e
podiam ficar em qualquer posição.
Por forma que o menino podia inaugurar.
Podia dar às pedras costumes de flor.

Manoel de Barros

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